O primeiro ano que passei dormindo.Foi tão gostoso!
Não estava triste nem contente,Só cansada, que acostumei dormir cedo.A manhã fresquinha ,ainda por vir um sol daqueles.
Saí na caminhada,tomei o café da manhã no jardim da minha mãe, antes
que se acabe tudo. Ninguém além de mim aprecia aquele lugar cheio de
plantas, ninguém enxerga um mundo de esconderijos e brincadeiras para os
netos(meus sobrinhos), comenta-se que o terreno vale muito, a casa é grande.
Penso comigo, que se um dia tivesse algum dinheiro, e uma casa como aquela e crianças e amor, o sonho seria perfeito.
Além de mim, apenas as crianças acham o lugar especial, para os outros é
trabalho.E por falar em crianças, apertaram a campainha: querem boas
festas.Tem um pote de balas imenso daquelas cor- de- rosa, e com as mãos
cheias vou distribuindo.
As crianças são impacientes, ensino:
-Olha, se voce esperar um pouquinho antes de recomeçar tocar a
campainha, sem tanto barulho ganham mais balas,experimenta! -Feliz ano
novo!
... E nas lembranças, vinte anos atrás minha filha pequena,
passamos o ano novo na Santa Flora.Eram inesquecíveis as festas que
aconteciam por lá, acredite, tem coisa que eu nem penso em contar!Já faz
mais de vinte anos, mas eu me lembro! ...E no dia seguinte, eu tava
acabada, que nunca fui de beber muito, que não precisava, mas dançar a
noite toda é de lei.
E a campainha da minha casa era um zunido
estridente, contínuo, um inferno literalmente.Eu de ressaca.Toca essa
porra desta campainha que me tirou do sério.Uma,duas,muitas vezes, até
que levantei num humor que Deus-me-livre-sai- de- baixo e levantei...
Mas daquele jeito, sem pentear os cabelos, nem se olhar no espelho(quem
me reconheceria? Eu mesma, teria medo).Passei o corredor ganhando o
chão furiosa e dei de cara com uma faca enorme que me fez vista lá de
cima da pia.Não tive dúvidas, agarrei na faca ,com raiva apenas na
cabeça, sem mais idéia nenhuma e fui de encontro a aquele barulho
atordoante , abri a porta, olhei diretamente nos olhos das crianças sem
dizer palavra, a faca enorme em punho, fui avançando sem tirar os olhos
daqueles tipos acordadores de mãe pós festa com balas disparando,
enquanto alcançava a campainha:
Meti a faca!Várias vezes que nem sei
como não morri eletrecutada,eu não pensava! Queria dormir e acabar com
aquele pandemônio que estava me enlouquecendo.Voltei pra cama e dormi
sossegada, pra mais um dia.(Quem tem criança pequena sabe que descansar é
preciso).
Nunca mais consertei a campainha, até hoje na minha casa
que é outra adoro atender o som suave de palmas,aqui nem instalei.É uma
das delícias de morar no interior.Quer buzinar na minha porta? Fique a
vontade. Mas saiba que eu nem viro a cabeça.Faço de conta que não estou
em casa. Ai, quem quer encontrar gente barulhenta?Ignoro sem remorso, e
sem campainha, conservo as facas amoladas, fico longe das tomadas e dos
fios, estou mais sossegada.
Olho para a criança atentamente e gosto de pela primeira vez distribuir balas pela manhã do ano seguinte:
(Ontem dormi cedo, nove e meia dei um feliz ano novo pra filhote, dormi
pelas onze e meia protegendo o desespero dos cachorros com os fogos,
todos juntinhos, saudáveis. )
Fui passar o café na mama.Levar um pão
australiano para o café da manhã.Bem cedo.Alguns conhecidos caminhando
pelas ruas da cidade : -Feliz ano novo!
...- Toca a campainha e espera a pessoa sair que eu te asseguro que ganhará mais balas!!!!
(repito como quem diz o melhor segredo:)
Ninguém gosta de barulho depois de uma noite de festa, os adultos
exageram um pouquinho, vão dormir muito tarde, bebem, e ficam mal
humorados, vai por mim, vai se dar bem melhor !
-Obrigada!!Disseram
as carinhas que eu observava sapecas em busca das guloseimas, excitadas,
impacientes, mal educadas, crianças, enfim, em coro desencontrado:
-Feliz ano novo.
-Brigadu!
-Feliz ano novo.
Renata Koury